Artigos e Debates

A SUSTENTABILIDADE E O SETOR FLORESTAL

Rafael Monteleone

08/07/2021

Conforme dados da Organizações das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO, 2015) a área florestal mundial ocupa 4 bilhões de hectares de florestas, sendo 291 milhões de florestas plantadas, representando 7,3% de toda área. Destes, é fornecida 50% de toda madeira utilizada no mundo. Os produtos provenientes de espécies arbóreas estão presentes no nosso dia a dia em diversas formas, incluindo a madeira serrada, papel, celulose, chapas/painéis de madeira, látex e alimentos como o palmito, açaí, castanha e erva-mate. Como parte de seus produtos, destacam-se os serviços ambientais como a conservação do solo, da água e o mercado de carbono, o qual vem ganhado cada vez mais importância.

O Brasil é referência mundial quando o assunto é floresta. Dentro do território de 850 milhões de hectares, 498 milhões são ocupados com florestas, representando a 2° maior área florestal do mundo. A competitividade brasileira é sentida principalmente a partir dos plantios do gênero Eucalyptus, natural da Austrália que possui mais de 500 espécies. O desenvolvimento da silvicultura por aqui retorna ao início do século XX, época dos primeiros plantios experimentais objetivando a fabricação de dormentes em linhas da Companhia Paulista de Ferrovias; o horto florestal localizado no município de Rio Claro, interior de São Paulo, foi um local fundamental na inserção desse gênero e detém uma rica história sobre a eucaliptocultura.

Mesmo com apenas 1,97% do território nacional plantando com florestas, a contribuição econômica e social do setor representa 1,3% de toda riqueza gerada no País; 6,9% do PIB industrial; 1,3 milhão de empregos diretos e 3,8 milhões de indiretos; somando à lista de benefícios, está o estoque de 4,2 bilhões de toneladas de CO2 (Indústria Brasileira de Árvores – Ibá, 2019). Uma das mais importantes funções desempenhadas por essas áreas, além do fornecimento de matéria prima para os mais diferentes setores, é sua contribuição na redução do impacto sobre as florestas nativas e sobre o meio ambiente, mantendo o equilíbrio de ecossistemas naturais, regulando o clima global, conservando os recursos hídricos, protegendo a biodiversidade e regularizando os fluxos de água.

Por meio da organização do Estado brasileiro e de sua constituição, definem-se os conceitos de florestas públicas e privadas, assim como para cada um deles são dirigidas e elaboradas leis, marcos regulatórios, instruções normativas que irão guiar as ações de manejo. As tomadas de decisões são marcadas por avanços em certas áreas e, ao mesmo tempo, retrocessos que trazem diversos questionamentos sobre os novos rumos tomados. Além de atender a demanda por produtos e serviços florestais, a governança deve-se atentar para combater e dificultar o desmatamento, a grilagem de terras públicas e a ocupação desordenada, resultando em benefícios sociais, ambientais e econômicos para empresas e comunidades, prezando pela valorização das florestas em pé. De tamanho continental, no Brasil a dificuldade da situação se agrava, na qual grande parte de nossas florestas públicas estão em regiões com baixíssima densidade demográfica, fronteiriças e de difícil acesso, atrapalhando a consolidação de instituições de controle e fiscalização.

A VINCULAÇÃO DO DESMATAMENTO À ATIVIDADE AGRÍCOLA: ESFORÇOS DO SETOR DE SOJA E PECUÁRIA

Michelle Márcia Viana Martins

25/06/2021

O acesso ao mercado global é determinado pela capacidade das empresas em fornecerem produtos de qualidade a preços competitivos. Adicionalmente, a crescente preocupação do público sobre as questões ambientais acrescenta as organizações um componente adicional na oferta dos produtos: a sustentabilidade. A pecuária e a cadeia da soja lidam diretamente com esse problema, quando os agentes privados dispendem grandes esforços para divulgarem a preocupação agroambiental associada aos seus sistemas de produção. Iniciativas para desvincular a prática do desmatamento à expansão das áreas agricultáveis para promover essas atividades, devem ser prioritárias para melhorar a imagem dos setores no agronegócio brasileiro.

Conservar as florestas é uma demanda crescente da população não apenas para manter a biodiversidade dos biomas locais, mas para reduzir os efeitos associados às alterações climáticas. O Brasil é detentor da segunda maior área de cobertura florestal no mundo, atrás apenas da Rússia, entretanto, entre os anos 2010 a 2020, manteve a primeira posição no ranking internacional de perda líquida média de áreas de florestas. Entre as causas do desmatamento, metade do volume desmatado está relacionado à conversão ilegal de florestas para a atividades agrícolas, seja na produção de commodities ou associada à prática de agricultura itinerante.

Estimativas apontam que entre os anos 2000 a 2012, 90% do desmatamento ilegal na região amazônica esteve relacionada à produção de soja e carne. Cerca de 17% da carne e 75% da soja cultivados nessas áreas foram destinados ao mercado externo e os principais destinos incluem UE, China, EUA, Índia e Rússia. O comércio dessas commodities teve um impacto direto na mudança do uso da terra e nas políticas ambientais dos países exportadores, e em muitos casos, essas políticas, impulsionadas pelo consumo excessivo de alguns dos principais países importadores, resultaram em desmatamento em grande escala entre outas consequências ambientais em prol da expansão das monoculturas.

Entre 2005 e 2013, 62% da perda de cobertura florestal no mundo foi atribuída à expansão de áreas agrícolas, destacando a produção de soja e carne bovina, entre outras culturas. Parte do crescimento da área desmatada tem relação com a demanda internacional de produtos agrícolas e a maior parte dos importadores são países que apresentam taxas de desmatamento decrescente ou aumento da cobertura florestal. Isso significa que cerca de um terço do aumento da expansão da área florestal nesses países é compensada pela importação de commodities das economias que promovem o desmatamento.

Essas conclusões expressam, de certa forma, o interesse conflitante dos países que mantêm a oferta de commodities à nível mundial com os esforços para a redução do desmatamento. Pensando nisso, as grandes empresas atuantes no comércio de soja e carne no Brasil, foram forçadas a exprimir seu compromisso em desvincular a produção brasileira desses produtos ao desmatamento. Esses esforços são caracterizados pela Moratória da Soja, de 2006, e pela Moratória da Carne, de 2009.

Essas iniciativas correspondem a decisão das grandes empresas dos setores em não adquirir grãos e carne bovina oriundas de áreas desmatadas. A compra dos produtos passou a ser certificada, os produtores que tinham suas produções vinculadas ao desmatamento não conseguiam efetivar suas vendas para essas empresas. As safras de soja de 2005/2006 passaram de 1,14 milhões de hectares para 5 milhões de hectares em 2018/2019, com um aumento da área produzida do grão no bioma amazônico de 260% desde 2006. Entretanto, apenas 1% da produção dessa área corresponde ao cultivo em áreas recém-desmatadas. Na pecuária, as iniciativas privadas refletiram na redução do número de propriedades com produção de pastagem relacionada a perda de cobertura florestal, de 26% em 2009 para 4% em 2013.

Apesar dos resultados positivos associados as Moratórias, os agentes privados se preocupam com o enfraquecimento dos mecanismos de controle público que resultaram nas recentes estatísticas de desmatamento e queimadas no bioma Amazônia. O problema maior é que as recentes aberturas da área florestal dão espaço para a produção de carne e soja de produtores não comprometidos com a proteção ambiental, manchando a imagem de todos os atuantes na cadeia.

Resultados de um estudo reflete a situação supracitada e elenca: a cobrança dos consumidores estrangeiros pela redução do desmatamento na Amazônia; a contribuição da devastação das florestas para atender as demandas de exportação, principalmente dos Estados-membros da UE; e a participação de apenas 2% das propriedades localizadas na Amazônia e Cerrado responsáveis pelo desmatamento na região. Sobre esse último ponto, o estudo aponta que 90% dos produtores brasileiros não tem qualquer envolvimento com o desmatamento ilegal. Porém, um número limitado de produtores, nomeadamente, “as maçãs podres” comprometem a reputação de todos os atuantes no setor.

Atores privados se uniram para assumir responsabilidades essencialmente públicas para evitar a rejeição de produtos brasileiros dentro dos mercados internacionais e os desinvestimentos do setor agrícola, mas ainda são iniciativas insuficientes para alcançar os mecanismos ideais de comando e controle, pois a estrutura geral de incentivos para os produtores muitas vezes não favorece cumprimento das leis florestais.

A fragilidade na governança ambiental expõe brechas e falhas no rastreamento das cadeias que facilitam a ocorrência do desmatamento. É importante que estratégias que promovam o avanço nas agendas de regularização fundiária e ambiental sejam consolidadas para elevar os incentivos a uma produção mais sustentável, com tecnologias de baixa emissão de carbono (como as sugeridas pelo Plano ABC) e com maior agregação de valor nas cadeias agroalimentares. Outra proposta para manter as reformas ambientais é a implementação de medidas de conservação apoiada pelos agentes internacionais. O apoio financeiro para essas medidas pode ser advindo de pagamentos de serviços ambientais, fornecimento de assistência técnica para os pequenos proprietários sem recursos para produzir de forma sustentável, e até o pagamento de um preço premium pelo produto legalizado – e até certificado, garantindo o manejo sustentável.

RESERVAS LEGAIS: PROTEÇÃO NECESSÁRIA AO PAÍS!

Fernanda Johnston

17/06/2021

O Brasil é um dos principais produtores agrícolas mundiais, estimulado pelo crescimento progressivo da demanda global por alimentos que, por consequência, impulsiona o aumento de áreas cultivadas. Porém, o incremento dessas extensões para cultivos agrícolas, muitas vezes, apresentam uma relação direta com métodos de conversão de áreas de vegetação nativa para atividades agropecuárias. Logo, com o propósito de fundamentar discussões a respeito da biodiversidade e a conservação da vegetação nativa, optou-se por salientar a importância das Reservas Legais (RL) neste texto. É de suma importância analisar a relação existente entre a biodiversidade e a vegetação nativa, ao mesmo tempo em que ocorre a expansão da agricultura para atender a demanda, principalmente, de alimentos.

Em vista disto, neste contexto é importante ressaltar o Projeto de Lei nº 2.362/19 (retirado de tramitação no dia 15 de agosto de 2019) que visava extinguir por completo as RL, para que então, ocorresse a expansão agrícola e o desenvolvimento do país, conforme argumentos expostos por agricultores e representantes do Congresso Nacional. Ao contrário do que fora argumentado, a conversão da vegetação nativa em terras para expansão agrícola, pode impactar de maneira negativa a produtividade da agricultura, pois devido à sua extensão, as RL são categóricas para os serviços ecossistêmicos e para a biodiversidade. Ademais, a intensificação de ecossistemas por meio da conservação da biodiversidade, pode ser uma forma sustentável de se obter um maior fornecimento de alimentos.

Ainda, justificar que a extinção das Reservas Legais, conforme o PL nº 2.362/19, pode estimular o desenvolvimento econômico do país é questionável, uma vez que os benefícios das RL para a sociedade, em termos de conservação da biodiversidade, bem‐estar para a sociedade e contribuição para a economia, não podem ser substituídos pelas Áreas de Preservação Permanente (APP) e pelas Unidades de Conservação (UC), pois possuem objetivos e funções diferentes das RL.

De acordo com estudos já realizados, os serviços ecossistêmicos fornecidos pelas RL possuem valor econômico para a sociedade, além de benefícios para os proprietários rurais, pois um hectare de floresta tropical pode originar um valor em torno de R$ 21.000/ha/ano pela prestação de 17 tipos de serviços ecossistêmicos, incluindo a polinização. Ao analisarmos os principais cultivos agrícolas que contribuem para alimentação humana, grande parte não apresenta autopolinização e, tampouco é capaz de frutificação e incrementos na quantidade e qualidade do fruto na falta da polinização por insetos. A polinização animal pode aumentar a produtividade e qualidade comercial dos frutos, além de intervir no peso de determinadas culturas. Ainda, diante da ausência de produtos agrícolas substitutos, é necessário avaliarmos as culturas individualmente para que o impacto econômico seja mensurado.

Para isso, empregam-se os índices de dependência, medidos em quatro classes e, baseados em estudos que justificaram que, algumas culturas quando não polinizadas exibiam uma redução entre 90 e 100% na produção; 40-90%; 10-40% e; entre 1-10%. Também, faz-se necessário o uso do valor de produção anual das culturas, com o intuito de quantificar o impacto da falta de polinizadores - particularmente as abelhas - na economia do país. De acordo com o Relatório Temático sobre Polinização, Polinizadores e Produção de Alimentos no Brasil, o valor de produção anual está disponível para 67 plantas, somando um valor de polinização em torno de R$ 43 milhões anuais.

De fato, percebe-se que os serviços de polinização prestados a agricultura brasileira dependem, principalmente, de polinizadores silvestres, apesar do constante desenvolvimento de métodos e técnicas para se aumentar a produção agrícola com abelhas manejadas. Portanto, é de extrema importância analisar a relação entre os polinizadores selvagens e habitats naturais, visto que, a densidade desses animais tendem a diminuir em cenários de mudanças na cobertura e uso da terra (LULCC) intensiva em função da demanda humana.


Decreto que exige demonstração de capacidade econômico-financeira é positivo para o saneamento. Um conjunto de empresas pode ter dificuldade em se adaptar às novas regras...

Gesner Oliveira

10/06/2021


O parágrafo único do artigo 10-B do novo marco legal do saneamento (Lei 14.026/20) previa que a metodologia para comprovação da capacidade econômico-financeira das empresas de saneamento deveria ser regulamentada após o novo marco entrar em vigor.

Quase um ano depois, o governo emitiu, em 31 de maio, o Decreto 10.710/21, que estabelece os parâmetros para a comprovação da capacidade econômico-financeira das empresas em duas etapas.

A etapa 1 fixa indicadores mínimos de capacidade financeira, como o ROE (sigla em inglês para retorno sobre patrimônio líquido) > 0.

A etapa 2 estabelece que a concessionária demonstre condições para cumprir o plano de investimentos e caso não as tenha, apresente um plano de desestatização até dezembro de 2022. Artigos relevantes são os seguintes:

Art. 5º Para a aprovação na primeira etapa de que trata o inciso I do caput do art. 4º, o prestador deverá comprovar que os indicadores econômico-financeiros do grupo econômico a que pertence atendem aos seguintes referenciais mínimos:

i. índice de margem líquida sem depreciação e amortização superior a zero; ((Lucro Líquido – depreciação – amortização) / Receita total);

ii. índice de grau de endividamento inferior ou igual a um; (Capitais de terceiros/Ativos totais);

iii. O ROE, índice de retorno sobre patrimônio líquido superior a zero (Lucro Líquido/Patrimônio Líquido); e

iv. índice de suficiência de caixa superior a um (arrecadação total/(despesas de exploração + despesas com juros e encargos com serviço da dívida + despesas fiscais ou tributárias computadas na DEX + despesas com amortização do serviço da dívida).

Art. 6º Para a aprovação na segunda etapa de que trata o inciso II do caput do art. 4º, o prestador deverá comprovar, nos termos do disposto neste Decreto:

v. que os estudos de viabilidade resultam em fluxo de caixa global com valor presente líquido igual ou superior a zero; e

vi. que o plano de captação está compatível com os estudos de viabilidade.

A avaliação será feita a partir da mediana dos indicadores econômico-financeiros dos últimos cinco anos, o que parece razoável para ter um horizonte maior de tempo.

Levantamento preliminar da GO Associados, baseado em amostra de 23 empresas classificadas como “Sociedade de economia mista com administração pública” ou “empresa pública”, considerando informações financeiras nos último cinco anos divulgadas pelo SNIS, indica que apenas treze atendem aos quesitos da primeira etapa da avaliação. Um estudo mais amplo com o conjunto das empresas está em curso pela Equipe da GO Associados.

Exemplo de empresas públicas que atendem a todos os critérios da etapa 1:

· CAGECE

· CAGEPA

· CAESB

· CEDAE

· SABESP

· COPASA

· DESO

· SANEPAR

· CESAN

· CORSAN

· EMBASA

· SANESUL

· SANEAGO

Por sua vez, o quadro 2 mostra o conjunto de empresas que não atendem os quesitos da primeira etapa do decreto.

Exemplo de empresas públicas que não atendem a todos os critérios da etapa 1:

· CASAN

· AGESPISA

· CAESA

· CAERD

· CAER

· CAERN

· CAEMA

· CASAL

· COSAMA

· COSANPA

Já há iniciativas sendo realizadas no caso das empresas públicas que não atendem aos critérios. Cite-se a Cosama, no Amapá, cujo edital de concessão para os serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário foi publicado recentemente e leilão deve ocorrer em 02/09.

O não cumprimento das exigências das regras de viabilidade econômico-financeira torna irregulares os contratos de programa ou celebrados via licitação.

A adoção de tais regras abre uma janela de oportunidade para as empresas do setor privado ou de capital misto, que em geral apresentam resultados de desempenho econômico-financeiro mais satisfatórios.

O Globo, 27/03/2021

Istoé Dinheiro

01/04/2021

Capital Reset

30/03/2021

Jota

29/03/2021